O arcebispo de Palmas (TO) avalia que três pontos positivos estão acontecendo na Amazônia e que vem do Sínodo, da sua preparação e da recepção da Querida Amazônia: a reunião, a revisão e a recriação.
No dia 12 de fevereiro celebrou-se o aniversário de dois anos da publicação pelo Papa Francisco da exortação apostólica pós-sinodal “Querida Amazónia”, documento no qual o Santo Padre compartilhou, a partir das reflexões do Sínodo especial sobre o bioma, os sonhos em relação à situação eclesial e socioambiental no território, como também em toda a Igreja universal.
Para marcar esta data, o portal da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) iniciou uma série de entrevistas com bispos que atuam no bioma e com os presidentes dos regionais presentes no território. O primeiro deles é o arcebispo de Palmas (TO) e presidente do regional Norte 3 da CNBB que engloba os estados do Tocantins, o sudeste do Pará e o nordeste do Mato Grosso, dom Pedro Brito Guimarães.
O arcebispo avalia que três pontos positivos estão acontecendo na Amazônia e que vem do Sínodo, da sua preparação e da recepção da Querida Amazónia: a reunião, a revisão e a recriação. “Me parece que estes três pontos estão em processo de entendimento e de implantação. São processos lentos, graduais, invisíveis, mas estão sendo formatados no coração da Igreja e dos fieis na Amazônia em relação a este bioma”, afirmou. Conheça, abaixo, a entrevista na íntegra.
Passados dois anos, desde a exortação apostólica pós-sinodal “Querida Amazônia”, do Papa Francisco, qual a percepção do senhor em relação à presença e as respostas da Igreja no Brasil à realidade vivido pelo Bioma? Percebe alguma mudança?
O tempo corre veloz. Já se forma dois anos da publicação da encíclica do Papa Francisco, “Querida Amazónia”. Fazendo uma retrospectiva da chegada desta Encíclica, a leitura e a compreensão demandou tempo porque ela chegou quase no início da pandemia da Covid-19. Foi uma agradável surpresa esta carta. Primeiramente pelo estilo. Na verdade, esta carta que chamo de registro gramatical, é uma verdadeira carta de amor à nossa região, à região Amazônica com todas as suas belezas, riquezas, debilidades, conflitos, problemas e desafios.
Eu queria destacar este gênero literário. Quando todo mundo esperava um documento dogmático, canônico, de permissão e proibição, como é o estilo de nós todos. E chegou uma carta de amor, o que para alguns foi um banho de água fria mas para nós que temos este viés mais poético, aliás ela está cheia de poesia, este viés mais místico e contemplativo, esta carta o grande significado e mudança está no estilo, no gênero literário e nas abordagens, sobretudo, dos sonhos. Isto parecia pouco para muita gente. Porque sonho é uma coisa tão normal que as pessoas não dão muito valor. A partir de agora as pessoas consideram que sonho é uma coisa de quem não tem o que fazer e está dormindo num travesseiro, numa cama. Sonho é querer, é sede e desejo. Aí da pessoa, organismo e instituição que não tenha sonhos ou quem não sonhe mais. Quem não sonha mais morreu.
A mudança não foi da encíclica para a realidade, mas da realidade para com a encíclica. A assimilação, o discernimento, nós ganhamos muito na compreensão na forma de olhar a natureza, essa região e bioma, na perspectiva afetiva, com um olhar menos intelectual e racional, mas guiado por uma teologia do coração.
Quais os desafios ainda permanecem em relação à presença da Igreja no Brasil no Bioma?
Eu destacaria que no mesmo território, e bioma, existem vários atores em vários setores, competindo, querendo seu espaço, tempo, seu ganho, a sua presença. Isto cria um desafio. Eu diria que o maior desafio da Amazônia é o desafio da missão, maior desafio da Igreja. Não existe outro desafio maior que este. O dinheiro por exemplo não é um desafio tão intransponível quanto à missão. Recentemente lemos a cura da filha da cananeia. Se a gente olhar aquele texto, a gente olha para o lado do costume. Mas ali está o desafio da missão numa das primeiras vezes que Jesus sai do território sagrado dos judeus, da terra prometida e vai ao limite do paganismo. Como se dialoga com o pagão? Como a gente vence as barreiras das religiões e dos entendimentos? O desafio da Amazônia é o desafio da missão da Igreja. No dia em que a Igreja vencer este desafio pode dizer que acabou sua missão, apagar as luzes, fechar as portas e deixar de existir. Mas isto também é o combustível para o missionário. Quanto maior o desafio, maior a paixão e a vontade de fazer acontecer dos missionários.
Quais os pontos positivos o senhor destacaria da presença da Igreja no Bioma?
Eu vou usar três palavras para descrever a nossa disposição com relação ao serviços da Igreja na Amazônia. Eu diria que a nossa missão na Amazônia tem que ser a partir da concepção de reunião. “Reunião” significa dizer que alguma coisa não está articulada e reunida e que nós vamos fazer uma reunião. Esse é o conceito. A Igreja precisa reunir o disperso, o tempo perdido, os conflitos, os pareceres, deixar esta emoção muito forte de lado e colocar os pés no chão e fazer esta reunião. Uma segunda palavra é “recriar”, refazer. A gente tem que criar algo novo, a mentalidade, a cultura, a esperança, fé e a paciência. Estas duas palavras descrevem bem o que queremos fazer em relação à Amazônia. A terceira palavra é “revisão” que significa ver de novo, a partir de um discernimento e um olhar diferente. Ver novamente, com olhos novos.
Eu diria que os três pontos positivos positivos que estão acontecendo na Amazônia e que vem do Sínodo, da preparação do Sínodo e da Querida Amazônia são a reunião, a revisão e a recriação. Me parece que estes três pontos estão em processo de entendimento e de implantação. São processos lentos, graduais, invisíveis mas estão sendo formatados no coração da Igreja e dos fieis na Amazônia em relação este bioma. Espero que com uma reunião, revisão e recriação a gente dê um salto de qualidade para a missão da Igreja na Amazônia. É o que eu penso.
Fonte: Dom Pedro Brito: 2º aniversário da “Querida Amazónia” – Vatican News